quarta-feira, 6 de julho de 2011

O Dejá-Vue

Éramos 5, o Bita, o Rocha, o Chico Zé, o Neca e o Tó Neves...
         Aquilo é que era uma “seita” , ninguém da zona, nos batia nas corridas de carros de rolamentos, nem mesmos “os de lá de trás”, “os das barracas”; íamos a pé até ás traseiras da uma fábrica de máquinas muito conhecida na Sra Hora, remexer nas (perigosíssimas) sucatas, à procura de rolamentos, eixos, etc. tudo servia para as nossas máquinas voadoras, bólides a bater qualquer velocidade do som...qual som, da luz, isso sim, da luz...Quando fazíamos o caminho de retorno a casa, já a nossa mente estava repleta de projectos, planos, muitas das vezes “lapadas”, pelo meio, quando algum tentava tirar peças a outro, o normal. Coitados dos vizinhos, o que tinham de aturar...Éramos duros! Queríamos, conseguíamos!...só o Tó Neves nos confundia, estava deslocado...mal chegava a casa, ia imediatamente esconder os rolamentos que tinha apanhado, vindo depois para a nossa beira, com um ar cândido de quem não tinha sorte nenhuma...ele tinha receio de pegar no martelo (peça nobre de ferramentaria, com a qual eu quase me tinha de haver, não fossem as minhas pernas, quando o pai do Rocha viu o que eu tinha feito à mão do filho, nas nossas construções..) O Tó Neves tinha medo de mexer nas tábuas de madeira, ele não trazia pregos de casa, nem nos acompanhava quando, qual grupo justiceiro e vingador, íamos pedir meças, quer dizer, andar “à porrada”, com “os de lá de trás”, “os das barracas”...bem, tudo bem; o Tó Neves era bom para quando algum de nós queria descascar em alguém, pois punha-se logo a jeito, como quem diz “estou aqui, existo, culpa-me a mim, não me importo, até gosto...faz-me sentir importante” ?! Curiosamente, já nessa altura, nós, crianças com 9 ou 10 anos (o Tó Neves já tinha 11), sentíamos, sem saber porquê, o que era puro, ás vezes grotescamente puro, e o que era venenoso...
            Um dia, vinha para casa da escola com o Rocha, vindo ele a minha casa para actualizarmos as nossas lista das “vitórinhas”, quando vimos o Tó Neves a bater na Teresa, que pelos vistos tinha tentado defender o irmão, o Nel...eles teriam 5 e 4 anos, por aí..!? Olhámos para o Tó Neves, que ficou sem graça, atrapalhado: “..eles chamaram-me nomes...oh! oh! comigo, já sabem, ninguém brinca!!!”, disse ele depois de ter visto, afinal, a nossa passividade total perante aquilo; já não era a primeira vez que assistíamos a situações daquelas, com o Tó Neves, e não percebíamos bem aquelas atitudes dele, para com os mais pequenos, e só com os mais pequenos, porque dos outros, ele tinha um medo que se pelava...bem, também não nos interessava nada perdermos tempo com aquilo, toca mas é de ver a lista das “vitórinhas”...
            Hoje, não faço ideia onde andarão todos eles, mas quase tenho total certeza que, tal como eu, o Rocha, se ainda for vivo, já percebe aquele tipo de atitude...se calhar também já foi vítima de qualquer covarde “pequeno ditador”...
...saindo do disco...

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